DECRETOS QUE PERMITEM CONSTRUÇÃO DE HOTEL DE 18 ANDARES NA PONTA DO CORAL SÃO IRREGULARES

Notícias 24/02/2015

Há diversas irregularidades no licenciamento aprovado pela Prefeitura para a construção do hotel de 18 andares na Ponta do Coral. O vereador Lino Peres, juntamente com o vereador Josemir Cunha, suplente do vereador Afrânio Boppré, protocolou requerimento pedindo a anulação dos decretos 12.670/2014 e 13.936/2015 da Prefeitura, que alteram o artigo 335 do Plano Diretor vigente em Florianópolis. A matéria foi aprovada por maioria na Câmara de Vereadores.

O decreto 12.670/2014 foi editado pelo prefeito César Júnior poucos dias depois (três semanas depois, entre 17/01 e 11/02/2014) da aprovação do Plano Diretor (Lei 482/2014), possibilitando que "os processos de aprovação de projetos, licenciamentos de obras, renovação de alvará, emissão de Habite-se, protocolados até o dia 17 de janeiro de 2014" sejam analisados em conformidade com o Plano Diretor anterior. Já o decreto 13.936/2015, que é uma extensão do Decreto 12.670/2014, prorroga os prazos do Plano Diretor de 2014, relacionados a projetos aprovados e alvarás concedidos. O que já havia sido estendido por um ano, recebe mais seis meses: todo projeto iniciado ou aprovado até 17 de janeiro de 2013 tem até 17 de julho de 2015 para ter continuidade.

Não há nenhuma disposição estabelecida na lei complementar do plano diretor que autorize o Prefeito Municipal a modificar prazo por ela estabelecida. Além disso, o projeto protocolado pela Hantei não tem validade, já que o original foi anulado e arquivado em 2013, e esta nova “versão” é muito diferente da anterior – sequer podendo se encaixar como “substitutivo”

As irregularidades são muitas. O geógrafo Cid Neto, membro do gabinete do vereador Lino e do movimento Ponta do Coral 100% Pública, faz uma avaliação técnica sobre o assunto:

- O zoneamento para a Ponta do Coral, aprovado pela Câmara Municipal de Florianópolis e sancionado na Lei do PD 482/2014, reduziu de 18 para seis andares, sem incentivo de hotelaria. Uma emenda que foi rejeitada buscava recuperar os 18 andares antes previstos, mas prevalecendo o risco de improbidade. O zoneamento não agradou nem ao movimento social, que demandava e demanda que a área seja 100%, nem ao empreendedor. No artigo 335 da atual Lei do PD, fica descrito o procedimento para a continuidade de obras e os prazos para execução de aprovações de projetos e alvarás expedidos. Em síntese, as aprovações e alvarás emitidos até 17 de janeiro de 2014 tinham, segundo o Decreto 12.670/2014, um ano de validade, ou seja, até 16 de janeiro de 2015.

- Desde o início de 2013, o alvará 1242 da Hantei estava anulado e arquivado. O prefeito então cria o Decreto 12.670/14, que altera o artigo 335, trocando seu teor. O artigo 335 foca no prazo de validade de licenciamentos e aprovações EXPEDIDOS anteriormente a vigência e em desconformidade com o novo plano diretor. Enquanto no Decreto 12.670/14 faz menção a processos de aprovação de projetos, licenciamento de obras e congêneres PROTOCOLADOS.

 - Apoiada no decreto irregular, mas ignorando a anulação e arquivamento do alvará 1242, em abril de 2014, a Hantei entra com “Pedido de Substituição” de Projeto. Apesar de não constar como um procedimento oficial, este termo é bastante usual e serve para cortar etapas em processos de aprovação de projetos e liberação de alvarás, mas desde que sejam aspectos de detalhe do projeto e não mudança do próprio projeto, como número de pavimentos, retirada da marina no projeto original, etc. O empreendedor dá entrada com um projeto pouco lapidado e com estudos incompletos - ou com um projeto de ainda grande escala para a área. Com a devolutiva da PMF, busca resolver os óbices apontados. Assim economiza ao não realizar antecipadamente os estudos completos e testa a boa fé e isenção da municipalidade. Com pedidos de substituição, deixa-se de pagar taxas e consegue-se trocar com facilidade itens do projeto original.

 - No caso da Ponta do Coral, os dois projetos apresentados pela Hantei são completamente diferentes, caracterizando muito mais que uma mera “substituição”. Além disso, como um projeto aprovado (Nº 60244), cujo alvará (Nº 1242), emitido em dezembro de 2012 (momento de troca de governo) e que foi anulado e arquivado no início de 2013 pela nova gestão, pode ter seu teor “substituído”? O novo e diferente projeto, agora Hotel Ponta do Coral, gerou uma nova aprovação, não se enquadrando no Decreto 12.670/14.

 - O projeto “substituto” Nº 24.690/14 não foi aprovado até 16 de janeiro de 2014, vésperas da nova lei do PD (482/2014), conforme está no art. 335 do novo PD, e foi protocolado somente em abril de 2014 e irregularmente aprovado em fevereiro de 2015. Portanto, fora do prazo do decreto do prefeito. Para agravar a situação, o protocolo de pedido de alvará ainda será solicitado, pois o empreendedor e a PMF aguardam o Licenciamento Ambiental da FATMA para dar sequência no processo.

- Mesmo com a redução apresentada neste novo projeto em 2015, resultado da pressão da sociedade e da intervenção do MPF, o empreendedor não consegue atender aos requisitos básicos e legais para ocupar a área alodial do terreno. Os óbices permanecem e o prefeito parece ter esquecido completamente de sua campanha e agora “dança conforme a música”. A aprovação do projeto Nº 24.690/14, em 2015, se deu sob a justificativa do Decreto 12.670 - ou seja, analisado sob os Planos Diretores de 1997 (Distrito Sede) e 1985 (Balneários). Nesse sentido, caso considerada a regularidade no processo, a Lei 180/05 vigora na análise e esta não é cumprida no novo projeto. A referida lei condiciona a instalação do empreendimento à realocação/adequação dos ranchos de pesca, a garantia de passeio com ciclovia e pequeno atracadouro público.

- Em 2015, o Prefeito César Souza Júnior lança o novo Decreto Nº 13.936/15, estendendo mais uma vez os prazos do Plano Diretor de 2014, relacionados a projetos aprovados e alvarás concedidos. Curiosamente, não há nenhuma referência ao decreto de 12.670 de 2014, sendo que o decreto de 2015 retorna a atenção aos projetos aprovados e alvarás expedidos, e não aos protocolados. O prazo, que já havia sido estendido por um ano, ganha mais seis meses: ou seja, todo projeto iniciado ou aprovado até 17 de janeiro de 2014, tem até 17 de julho de 2015 para ter continuidade.

- No dia 12 de fevereiro de 2015, diante dos novos fatos e da ciência do processo ter sido encaminhado para o Licenciamento Ambiental, o Movimento Ponta do Coral 100% Pública reuniu cerca de 100 pessoas em um ato realizado no dia em frente à sede da FATMA, órgão estadual responsável por licenciar empreendimentos de grande impacto. Foi cobrada lisura e idoneidade dos servidores e diretores no processo de licenciamento, culpabilizando a FATMA pela co-autoria na irregularidade da PMF caso seja dada sequência ao estudos de um empreendimento sem base legal. Com presença e apoio de alguns vereadores (Afrânio, Pedrão e Lino Peres), o movimento conseguiu protocolar as solicitações. Mas, com base na Lei Orgânica do município, que estabelece que os vereadores podem ter acesso a documentações em trâmite, os vereadores Lino Peres e Afrânio Boppré conseguiram adentrar o prédio da FATMA, fotografar os documentos. Garantiu-se a entrega na íntegra dos documentos na semana seguinte, quando uma Comitiva, constituída por representantes do Movimento Ponta do Coral 100% Pública e destes vereadores, reuniram-se com o setor jurídico e técnico da FATMA e conseguiram examinar mais detidamente toda a documentação e constatar falta do documento de licenciamento da Prefeitura, e somente um documento sem assinatura. Constataram também a falta de folhas carimbadas, parando na folha 3050, o que é uma irregularidade administrativa grave.  No dia 19/02, finalmente foi entregue aos representantes do movimento e ao vereador Lino Peres a documentação impressa e CD com o projeto técnico gravado.

Em resposta ao requerimento nr. 012/2015 do gabinete do vereador Lino Peres, no dia 23 expirou o prazo dado pela própria SDMU para a entrega da aprovação do alvará de licença à Hantei para o Hotel Ponta do Coral. Mas até a publicação deste texto (terça-feira, 24/2), a PMF não havia encaminhado o documento. A Lei Orgânica do Município versa:

Art. 32.  Constituem condutas ilícitas que ensejam responsabilidade do agente público ou militar:

I - recusar-se a fornecer informação requerida nos termos desta Lei, retardar deliberadamente o seu fornecimento ou fornecê-la intencionalmente de forma incorreta, incompleta ou imprecisa;

O retardamento na entrega da informação, além do desrespeito ao vereador como fiscal dos atos do executivo, abre precedente para responsabilização dos agentes públicos que se comprometeram textualmente em enviar a informação.  

 


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